Eu agora acendo as
luzes para caminhar pela casa, que é pequena de cozinha grande, a torta de
legumes está no forno porque eu não tenho ido mais ao portão e não tenho visto
as pessoas porque não tenho tido vontade, me lembro dos meus 15 anos quando o
universo estava nos livros e as vidas nos filmes eram mais interessantes do que
a vida dos meus amigos e da escola, poucos sabem mas eu não subestimo mais o
mundo, é tudo tão transparente não é mesmo ? Desisti de tudo o que me foi
colocado porque tudo isso não tem essência e estava mesmo sacrificando a minha
vitalidade pelo que os outros chamam de futuro. Não acredito mais na arte, não
acredito nas doenças pessoais que nos fazem criar. Estou buscando pelo cheiro
da natureza úmida e das pedras cavernas grutas que me enchem de algo que eu não
identifiquei ainda, alexandre é um menino do mato com muita vitalidade que diz
sobre o desvendar da existência de maneira clara e simples. Eu e joão não
teremos filhos graças a Deus porque nós dois jamais daríamos certo neste ângulo
em que nos colocamos, tem o sexo gosto jeito gesto dentro do nosso contato
íntimo que também nos foi tirado mesmo com tanto tato profundo, algo em mim
desatou e andei tão amarga, acho que a vida é mesmo espirilada eu juro que
parei de tentar entender qualquer dinâmica, tenho tentado respirar e beber
água, não sinto saudade de são paulo e da tristeza em que aqueles corpos se
encontram, um lugar mecânico porém pulsante, não sinto falta do sesc pompéia
porque eu realmente comecei a sentir medo dos trajetos todos necessários a
serem percorridos dentro da cidade, então as coisas todas bonitas pararam de
fazer sentido, entende? Cavuco dentro de mim hildas bukowskis henrys e acordo
de madrugada pra pensar na vida e no meu futuro e de Fer, que é mesmo uma jóia
preciosa rara e precisa de amor e beleza e alegria, porque a vida vai continuar
sendo um mar maluco indesvendável mas posso fazer esforços para que ele
encontre as coisas mais bonitas que a existência pode oferecer. Autumn me faz
ser bonita e interessante mas a realidade é que estou de pijama e não lavo o
cabelo há 6 dias, minha pele e cabelo tem a sorte da genética mas gosto mesmo é
de ficar ouvindo piano acender velas e imaginar a vida dentro de uma casinha no
meio do mato. Voltei a cozinhar, aos poucos a ler, gostaria de voltar a dançar
em breve. Acredito no yoga denovo e voltei a praticar regularmente, dentro de
casa as coisas tem mais silêncio e posso ouvir o barulho de mim mesma que hora
ou outra assusta mas não sinto mais medo porque também tem uma paz gostosa que
há muito não sentia...me lembro da vista da janela do quarto de joão, um
quartinho apertado compactando nosso possível amor, saudade de seu cheiro mas
não saudade de seu jeito muitas vezes agressivo de revelar-se, nos abraçamos
tão pouco e apenas tagarelamos sobre teorias furadas. Saudade de nossas
caminhadas, não saudade de seu desprezo. Não saudade de nada. Estado de
presença absurdo que me tira de qualquer passado futuro. Será?
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